quinta-feira, novembro 10, 2011

Não somos os “queridinhos” da mídia


Tico Santa Cruz revela que o Detonautas foi escolhido pelo público e seu compromisso é com ele

O ano era 1997, início da internet discada no Brasil. Entre uma sala de bate papo e outra, Luís Guilherme e Eduardo Simão, mais conhecidos como Tico Santa Cruz e Tchello, deram o pontapé inicial para a banda que é hoje referência do rock nacional: Detonautas Roque Clube, ou simplesmente Detonautas. A história da banda é marcada por altos e baixos, conquistas, sucesso, mas também tragédia. Suas letras trazem mensagens positivas de amor e emoções, críticas contra a violência e corrupção, principalmente após sentirem na pele a perda de um integrante para a violência carioca.

Com várias premiações como um VMB de Banda Revelação e outras várias indicações, Detonautas foi escolhida para ser a banda oficial do Interação UPF 2011. O vocalista Tico Santa Cruz conversou um pouco com a gente antes do show. Confira:

NEXJOR: Começando então pelo Rock in Rio, como foi para vocês a experiência de dividir o palco com outros grandes nomes da música, como o Guns N’ Roses eSystem of a Down?
Tico Santa Crus (TSC): É uma experiência que pontua o encerramento de um ciclo e a abertura de outro. Quando era adolescente, sonhava em poder tocar em algum lugar assim, com muitas pessoas, mas nunca imaginei que seria em um festival de tamanha magnitude, um festival internacional que foi transmitido para vários países. Poder ficar ao lado de bandas que nós não só admiramos, mas, gostamos. Eu, particularmente, sou muito fã do Guns e do System, embora eles tenham discursos completamente diferentes, porque O System fala justamente o contraponto do que o Guns vive, mas creio que no fim a música supera tudo isso. É uma maneira de unir as pessoas em torno de uma coisa bacana, que é essa diversidade, e para o Detonautas, que esteve presente, sentindo na pele foi mais legal ainda.

N: O show do Detonautas, no último dia do Rock in Rio, 2 de outubro, foi eleito o melhor show nacional do Palco  Mundo pela enquete UOL. Como foi para vocês conquistarem isso?
TSC: Foi uma surpresa pra nós. O show do Detonautas sempre foi muito visceral, somos uma banda muito mais de palco do que de estúdio, de disco, de programas de TV. O Detonautas foi uma das bandas que não foi mencionada por qualquer veículo de comunicação, mesmo estando confirmada no palco principal. Mas acredito que, depois do show, conseguimos de alguma maneira mostrar o que fazemos, porque talvez algumas pessoas não conectassem a música a banda, até tivessem a atenção voltada para as questões com as quais eu me envolvo, e isso às vezes confunde as pessoas, o meu ponto de vista particular e o da banda, enfim… Acho que ali se conectou tudo, porque antes de qualquer coisa somos uma banda e a gente faz música. Então, foi muito legal pra gente.

N: O Rio Grande do Sul é um dos estados de onde mais saem bandas de rock do Brasil. Você sente alguma diferença em tocar para o público gaúcho?
TSC: De fato, o Rio Grande do Sul é um país dentro do Brasil. Eu, por exemplo, estou viajando a 13 anos dentro do Brasil. Conheço as bandas daqui, já trabalhei em algumas ocasiões, nada registrado oficialmente, mas já participei de shows, já presenciei alguns como ouvinte, acho que o RS tem bandas muito bacanas, acho que o Sul deveria ocupar o espaço que até foi utilizado pelos Engenheiros durante um bom tempo nos anos 80, e que talvez hoje seja ocupado por outras bandas, até com as quais eu não me identifico. Acredito que aqui no sul tem bandas que representam muito mais o estado do que aquelas que estão fazendo esse papel. Então, eu torço pra que essas bandas do sul ganhem notoriedade para que, de fato, o Brasil possa conhecer o que é feito aqui, qual a verdadeira raiz no rock do Rio Grande do Sul.

N: No site da banda você se define como um parasita de celebridades importantes ou não. O que você quis dizer com isso?
TSC: Bom, (risos) na verdade isso é uma ironia a essa glamuralização do nada. As pessoas se expõem e querem ser vistas, todos os artistas querem. Mas existe uma diferença muito grande entre quem tem alguma coisa pra oferecer com conteúdo e aqueles que querem aparecer somente pra tirar fotos e dar autógrafos. Eu me coloquei como parasita porque eu consigo me “aproveitar” dessa maneira para também me inspirar e escrever minhas coisas, ter meus leitores e tudo, mas de uma forma para onde eu tenha uma simbiose com as pessoas que estão lendo e que elas possam entender qual é o meu objetivo com o blog, com as músicas e as mensagens que eu tento transmitir. Enfim, ser famoso só por ser famoso se torna uma coisa meio inútil em minha opinião, porque, se eu não tivesse nada para oferecer e pudesse desfrutar de uma vida de celebridade, talvez eu não estivesse falando assim. Mas acredito que as pessoas que têm conteúdo deveriam ser mais exaltadas em prol da exaltação do nada.

N: As redes sociais hoje são mais uma forma de interação das bandas com o público. Como é a relação de vocês com os fãs nas redes sociais e na internet em geral?
TSC: O Detonautas teve sua formação através da internet. Então, nós fomos à primeira banda no Brasil a usar a internet como meio de disseminação de conteúdos, por volta de 1996 e 1997. Sempre estivemos conectados à rede e foi o que construiu nossa carreira, o que propiciou tudo que a gente tem hoje, o que fez o Detonautas se tornar uma banda famosa e conhecida no Brasil todo. Mas, acima de tudo, foi o que nos deu a independência pra não precisar de nenhum intermediário entre a banda e os fãs. Então, talvez tenha sido e continua sendo a ferramenta mais importante e valiosa na mão de quem sabe usar, para que possamos chegar aonde queremos, e ultimamente a banda tem conseguido isso.

N: Como tudo na vida tem seus altos e baixos, com as bandas não é diferente. Qual a maior dificuldade que a banda já enfrentou até aqui?
TSC: O Detonautas é uma banda que não foi escolhida pela mídia como uma banda queridinha e nunca foi exaltado por canais de TV, premiações. Na realidade fomos escolhidos pelo público. Então, o nosso compromisso é com o público.  Pra nós é um pouco difícil porque existe uma geração inteira que às vezes se pauta somente pelo que a mídia coloca e determina como sendo legal e o que não é. Eu combati muito isso, falei e expressei, fui direto às vias práticas mesmo de me posicionar profissionalmente como um artista que não compactua com esse tipo de mecanismo. Para ser bem sincero, nós passamos por muitas dificuldades. Tem gente que acha que o Detonautas acabou que a banda não faz mais shows, principalmente antes do Rock In Rio, por não estar o tempo todo na TV, não ter hashtag o tempo todo no twitter. Eu não quero mendigo, não quero fãs que fiquem o tempo todo pedindo coisas. Quero pessoas que pensem que raciocinem que tenham uma filosofia de vida. Então, de certa forma os nossos altos foram quando desfrutamos dessa popularidade, mas não através dos meios de comunicação tradicionais, mas através da legitimidade do público. E os nossos baixos talvez fossem os momentos passados depois da perda do Rodrigo, quando o nosso irmão foi vítima da violência no Rio de Janeiro.  Isso aí é uma coisa que só quem vive mesmo pode dizer. Eu não sei como representar em palavras, mas esse foi o momento mais difícil da banda. Posso dizer que foi o fundo do poço mesmo fisicamente, mentalmente, e a nossa carreira também deu uma desvirtuada do caminho que estávamos seguindo.

N: O quarto disco, O Retorno de Saturno, tem um significado especial na carreira da banda?
TSC: O Retorno de Saturno é uma fase astrológica na verdade. Ele acontece dos 28 aos 30 anos pra quem gosta de astrologia e tudo. É uma fase revolucionária, pois você deixa de ser jovem e se torna realmente um adulto responsável. Você vai começar a colher o que plantou nesses anos anteriores. Ele representa essa maturidade da banda, e no disco tem várias músicas em homenagem ao Rodrigo, inspiradas no que vivenciamos. O Cd todo foi inspirado naquele pós- trauma que conseguimos superar, mas pra mim particularmente, é um dos discos mais bonitos da banda. Talvez comece uma linha de letras minhas que sejam mais maduras e que, aí sim, talvez tenha uma conotação na qual eu me espelho nos meus ídolos e consiga escrever coisas atemporais.

N: “Meus olhos grandes de medo revelam a solução”. Do que o Detonautas mais tem medo?
TSC: Eita! Que pergunta difícil… Eu acho que todo mundo tem medo de perdas, perder alguém que você ama muito. Já tivemos uma perda na verdade… Assim, o sucesso, a fama, tudo isso a gente sabe que é passageiro, mas as pessoas não. As pessoas fazem parte da nossa vida, deixam um pouco de si e levam um pouco da gente. Então, nosso maior medo é de alguma maneira que a gente se perca do caminho ou se perca das pessoas com as quais nos relacionamos, que perca o bom senso, perder a amizade. Acho que esse é o medo da maioria das pessoas, não só do Tico, não só do Detonautas, mas sim de todos os que vivem.






Nenhum comentário:

Postar um comentário

Caso seu comentário apresente qualquer tipo de ofensa, mentira ou agressão ele será deletado sem aviso prévio.